O fundo soberano da Rússia e a farmacêutica russa ChemRar anunciaram nesta quinta (24) um acordo para fornecer a 17 países, inclusive o Brasil, um antiviral contra a Covid-19. Segundo o fundo, que bancou também a criação da vacina Sputnik V, o Avivafir está sendo negociado com um laboratório privado brasileiro, que não teve o nome divulgado. Para ser usado, ele precisa ser aprovado pela Anvisa.
A droga em questão é o Avifavir, nome comercial do favipiravir,
composto que é usado desde 2014 no Japão contra a gripe chamado de Avigan.
Em abril, sua fabricante, a Fujifilm (a mesma do ramo
fotográfico), começou testes clínicos de fase 3 para determinar se ele poderia
ser eficaz no combate ao novo coronavírus. Seu princípio é o de inibir a enzima
polimerase, que ajuda o patógeno a se reproduzir quando invade uma célula
saudável.
A Rússia iniciou testes próprios com um genérico sob licença
japonesa e, em junho, aprovou o uso emergencial de 60 mil doses do remédio em
74 de suas 85 regiões.
Como no caso da Sputnik, houve críticas à aprovação sem o fim
dos testes clínicos. Segundo o Ministério da Saúde da Rússia, como o remédio
não trazia riscos à saúde por já estar em uso, isso seria tolerável.
Segundo o órgão, 940 pacientes foram acompanhados. Neles, 30%
tiveram o Sars-CoV-2 eliminado do corpo e o restante, reduziu seu tempo de
tratamento de sintomas como pneumonia leve de quatro para dois dias.
Ainda assim, houve questionamentos na comunidade médica
russa.
Nesta quarta (23), a Fujifilm divulgou os resultados de sua
fase 3, apontando que o remédio de fato é eficaz para reduzir o tempo de
tratamento em casos não graves da Covid-19. Agora, pretende iniciar o processo
de aprovação do uso da droga no Japão, o que pretende concluir em outubro.
A ação do Avifavir é semelhante à da droga experimental
remdesivir, cujos estoques mundiais foram virtualmente sequestrados pelo
governo dos Estados Unidos, numa iniciativa condenada pela Organização Mundial
da Saúde.
Os russos já haviam enviado a medicação para as ex-repúblicas
soviéticas Belarus, Cazaquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Turcomenistão. Além
deles, na segunda (21), o governo da Bolívia anunciou a compra de 150 mil doses
da droga.
Agora, o fundo soberano afirma que deverá fornecer o remédio,
que custa cerca de três vezes menos que o Remdesivir, para Brasil, Argentina,
Bulgária, Chile, Colômbia, Equador, El Salvador, Honduras, Kuwait, Paraguai,
Panamá, Arábia Saudita, Sérvia, Eslováquia, África do Sul, Emirados Árabes
Unidos e Uruguai.
“Quando nós registramos a primeira droga contra o coronavírus
no mundo, houve ceticismo porque o Japão ainda não havia a registrado. Agora a
eficácia está comprovada”, afirmou Kirill Dmitriev, presidente do fundo.
A estratégia de marketing dos russos na pandemia tem sido
agressiva. Após uma atitude inicial negacionista do governo de Vladimir Putin,
o país abraçou uma agenda de busca pela vacina e por drogas com velocidade
criticada por médicos russos e estrangeiros.
No caso da Sputnik V, ela foi registrada em 11 de agosto para
uso civil, a primeira do mundo. Na verdade, ela só tinha passado pelas fases 1
e 2 dos ensaios clínicos, indo para a fase 3 agora —Dmitriev diz que há mais de
50 mil voluntários inscritos para os testes.
Nenhum estudo científico havia sido publicado até o dia 4 de
setembro. O texto aprovado pela prestigiosa revista britânica The Lancet
apontava a eficácia do imunizante, mas ressaltava que faltava ainda a fase 3
para confirmá-lo.
Mesmo o estudo foi alvo de críticas de um grupo de
cientistas, que questionou a duplicação de alguns resultados. Os russos
responderam ao texto com um novo artigo na mesma revista.
Dmitriev disse à Folha, na semana retrasada, que as críticas
são parte de um jogo político que une governos contrários ao Kremlin e as
grandes farmacêuticas, que controlam 80% do mercado mundial.
Seja como for, há um padrão de anúncios que se antecipam a
resultdos clínicos. Para Dmitriev, isso é justificável dada a emergência da
pandemia e pelo fato de a Rússia usar como base medicamentos que já estavam em
uso —o favipiravir no caso da droga e o vetor adenoviral humano, no caso da
Sputnik.
Ainda assim, há uma certa opacidade nas ações. Na entrevista
à Folha, o presidente do fundo revelou que negociava a produção da Sputnik V
com parceiros europeus e americanos, além de parcerias conhecidas como as com a
Índia ou com os governos do Paraná e da Bahia.
Ele disse que anúncios deveriam ser feitos nas próximas duas
semanas. Tal prazo acaba nesta sexta (25), e o fundo informou que as
negociações continuam, mas não havia ainda acordos a serem revelados.
FOLHA DE S.PAULO
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