domingo, 14 de julho de 2013

Clubes do Brasil negociaram US$ 190 mi em paraíso fiscal

Clubes de futebol do Brasil movimentaram US$ 2 bilhões (R$ 4,52 bilhões) nos últimos dez anos com compra e venda de atletas ao exterior.
Parte desses negócios passou por paraísos fiscais ou por países que integram a lista de suspeitos de apoiarem o terrorismo. A falta de informações também marca parte desses contratos.

Entre janeiro de 2002 e dezembro de 2012, foram registradas 4.818 negociações de compra e venda de atletas, de acordo com dados inéditos obtidos pela Folha com o Banco Central, por meio da Lei de Acesso à Informação.
Do total negociado nestes dez anos, cerca de US$ 190 milhões foram com paraísos fiscais ou países que integram a lista do Conselho de Segurança das Nações Unidas referente ao combate ao financiamento do terrorismo, como a Coreia do Norte.
Todo dinheiro resultante da negociação de um atleta com o exterior precisa ser registrado no BC.
Os contratos apresentam informações sobre a origem do dinheiro, quando um jogador é vendido para o exterior. Ou o destino da verba, quando um clube nacional contrata alguém de fora.
Segundo os dados do BC, os clubes brasileiros negociaram US$ 14 milhões com as Ilhas Virgens e as Ilhas Virgens Britânicas, dois dos mais famosos paraísos fiscais do mundo. Com as Bahamas, foram duas negociações, que somaram US$ 6,7 milhões.
Com a Suíça, foram outros US$ 37,5 milhões. O Atlético-MG, por exemplo, comprou em 2011 os direitos de Guilherme por US$ 6,7 milhões, a quarta maior negociação da história do futebol brasileiro.
O jogador pertencia a um time da Ucrânia, mas o dinheiro foi pago a uma empresa suíça. Segundo o clube, "o valor foi depositado na conta e local indicados conforme contrato da negociação".
Entre 2006 e 2007, o Palmeiras fez duas compras no Chipre, também considerado um paraíso fiscal, totalizando US$ 7,4 milhões. Entre 2009 e 2011, o Corinthians fez dez negociações com uma empresa do Panamá, totalizando US$ 2,1 milhões.
Os dois clubes não responderam aos questionamentos da reportagem até o fechamento desta edição.
Há ainda casos de contratos "fantasmas", nos quais as transações envolvendo clubes no exterior foram registradas como "não informadas" no BC.
Técnicos dizem que os dados estão arquivados, apenas não podem ser extraídos por um problema de informática. O banco não respondeu até a conclusão desta edição.

LAVAGEM
As negociações internacionais envolvendo o futebol passaram a chamar a atenção das autoridades mundiais.
O Gafi, órgão internacional de combate à lavagem de dinheiro, produziu um relatório, em 2009, explicando como o futebol se tornou um alvo prioritário global para a lavagem de dinheiro de crimes.
Segundo o órgão, entre as práticas mais comuns em países como o Brasil estão o investimento de dinheiro sem origem definida em um time com dificuldades financeiras, vindo do tráfico de drogas, de armas ou simplesmente destinado a, depois de "esquentado", corromper os que "têm destaque político no país".
O Gafi listou características do futebol que facilitam a lavagem, entre elas o fato de que os preços podem apresentar forte oscilação; a pouca ou nenhuma regulamentação ou fiscalização; a difícil avaliação quanto ao preço e à qualidade dos jogadores negociados e os poucos casos de punições de clubes, atletas e outros envolvidos.
Para Mauro Salvo, autor de "Lavagem de Dinheiro no Futebol Brasileiro" --um dos poucos estudos acadêmicos sobre o tema no país--, a prática é mais "profunda e complexa" do que se pensava.
"As transferências são realizadas em todo o mundo, proporcionando amplas oportunidades de lavagem. Além disso, o esporte é essencialmente caracterizado por um elevado grau de imprevisibilidade sobre resultados, o que pode levar a um aumento da tolerância aos pagamentos aparentemente irracionais", disse o economista.

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