Um ex-padre que foi membro da Igreja Católica e Anglicana é apontado por dois homens como responsável por abuso sexual de adolescentes. Atualmente, o religioso vive em Caçapava do Sul, na Região Central do Rio Grande do Sul, para onde se mudou há cerca de 20 anos. O caso veio à tona com a publicação do livro de um empresário mineiro de 48 anos. A história relatada na obra foi identificada por outro homem, que se diz vítima do mesmo agressor. O homem religioso será investigado, como mostra a reportagem do Teledomingo, da RBS TV (veja o vídeo acima).
Depois de 30 anos de silêncio, Marcelo Ribeiro, natural de Minas Gerais, resolveu falar sobre a história de sua adolescência, vivida em Novo Hamburgo, na Região Metropolitana de Porto Alegre. Há três meses, ele revelou em um livro ter sofrido abusos sexuais por quando tinha entre 12 e15 anos, e participava de um coral na cidade gaúcha.
“Quando eu tinha 11 para 12 anos, em uma viagem, eu acordei com ele na minha cama. E não entendi o que tinha acontecido. Mas ele fez o gesto de silêncio. Eu entendi que não poderia falar. A partir daí. os assédios começaram com beijos, só que eu já era uma criança dominada por ele, eu já tinha uma obediência absoluta, isso facilitou o abuso sexual”, conta.
Ao deparar com um exemplar do livro, o violoncelista Alexandre Diel, viu sua história contada nas páginas da obra. Ele afirma que sofreu o primeiro abuso cerca de 2 anos depois de começar a fazer parte do coral, pouco depois de Marcelo deixar o grupo.
“Nesse dia, que estava só eu, ele estava com um balde de roupa suja, e me chamou para levar as roupas para lavar. Desci com ele e, quando pegava a roupa sujo, ele fechou a porta, baixou minhas calças e me penetrou. Eu fiquei apavorado, mas ele falava que isso para Deus era uma coisa bonita, que não era pecado, mas que não pode falar para ninguém”, descreve. Segundo ele, os crimes se repetiram durante quase três anos.
Não é a primeira polêmica envolvendo João Marcos Porto Maciel, ou Dom Marcos de Santa Helena, como é conhecido. Em 2009, o religioso foi expulso da Igreja Católica. Representantes dizem ter recebido denúncias de assédio, que não foram comprovadas.
“Em 2009, ele foi excomungado e suspenso perpetuamente do exercício ministerial sacerdotal. Ele não é padre católico atualmente, não responde a nenhuma igreja”, diz o padre Rudinei Lasch, pároco de Caçapava do Sul.
Depois da excomunhão, Dom Marcos ingressou na Igreja Anglicana, de onde também foi afastado dois anos depois. Fora das duas instituições, o ex-padre fundou uma congregação própria que funciona em um templo em Caçapava do Sul, que recebe menores de idade em vulnerabilidade social.
Uma equipe da RBS TV foi até o templo para falar com o religioso, mas não foi atendida por ele. No local, a porta foi aberta por um adolescente. Um representante de Dom Marcos não autorizou a entrada no local e disse que atualmente 10 adolescentes têm aulas no local durante o dia, e não passam a noite lá. O G1 também tentou conversar com o padre, mas o jovem que atendeu o telefone disse que ninguém no mosteiro iria se pronunciar.
Há quatro anos, a polícia foi procurada por um menor de idade que vivia no templo de Dom Marcos, e tinha denúncias a fazer. “Quando o menino saiu do mosteiro, ele procurou a delegacia relatando que não queria retornar ao local e teria informado alguma questão de violência física. Como não existiam provas, fizemos um pedido para a juíza para o rapaz fosse retirado do templo e colocado em um abrigo”, conta a delegada Fabiane Bittencourt.
No início de 2011, o adolescente foi expulso do novo abrigo. O processo está em segredo de Justiça, mas o relatório feito pela instituição foi obtido com exclusividade. O documento diz que o menor tinha mau comportamento e tentava praticar atos sexuais em frente a outros adolescentes. Ele disse aos instrutores que manter relações com os colegas era comum no local onde morava anteriormente, que seria o templo de Dom Marcos. Entretanto, a Polícia Civil diz que essa informação nunca chegou ao gabinete.
"A delegacia nunca recebeu nenhum elemento concreto, e nunca nos foi informado nenhum fato que nos impulsionasse a abrir uma investigação sobre isso", acrescenta Fabiane.
O trabalho que o próprio representante de Dom Marcos diz que faz no templo com adolescentes também é desconhecido das autoridades de Caçapava do Sul. "Este local não é cadastrado no Juizado da Infância e da Juventude. Não se trata de um local onde crianças que estejam sobre o amparo de medidas de proteção sejam encaminhadas pelo Poder Judiciário ou pelo Ministério Público”, explica a juíza da 2ª Vara de Caçapava do Sul, Taíse Velasques Lopes.
Entrar no templo não é fácil nem para o Conselho Tutelar de Caçapava do Sul, que deve fiscalizar as atividades dos menores. Para fazer uma visita, os conselheiros precisam agendar com antecedência e, quando chegam ao local, são impedidos de falar com os adolescentes.
"Só olhamos. Não conversamos com as crianças, porque não foi permitido. Ele disse que as crianças estavam em atividade e disse que não era permitido", conta a coordenadora do Conselho Tutelar de Caçapava do Sul, Claudia Fernandes.
Em dois anos, o Conselho Tutelar fez três visitas ao local. O Ministério Público diz desconhecer as dificuldades na fiscalização.
“A partir de agora, vamos abrir uma investigação com base no material que chega ao MP pela imprensa. Vamos entrar em contato com o Conselho Tutelar, solicitar informações. Possivelmente o pessoal do Ministério Público vai fazer uma vistoria do local, e vamos começar a investigar os fatos e ver o que está acontecendo”, diz a promotora pública Cíntia Foster.
Alexandre e Marcelo dizem que hoje fariam as acusações em juízo, mas os casos não podem mais ser julgados. Por causa do tempo que passou, os crimes prescreveram. Mesmo assim, se dizem aliviados por conseguir, finalmente, dividir as suas histórias.
“Sem dúvida, foi a melhor coisa que eu poderia ter feito. Para qualquer um que tenha sido abusado na infância e esteja até hoje guardando esse segredo, esse peso, posso dizer para botar para fora, porque além de estar fazendo mal para si mesmo, está sendo cúmplice de quem o abusou”, desabafa Alexandre Diel.
* Do G1
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